quinta-feira, 2 de junho de 2011

O Dilema da FAIXA-PRETA


A faixa-preta é uma meta a todos que praticam alguma arte-marcial, qualquer um que se engaje na pratica sonha com uma pretinha na cintura, normal. Existe todo um mito em volta da cor preta de uma faixa. É a garantia de que pelo menos naquela arte a criatura que tiver a preta é o perito no assunto. Isto é o que os leigos pensam...

Mas nos primórdios, quando o karate ainda era chamado de To-de, lá em Okinawa, sequer existia a tal da faixa-preta. Funakoshi, por exemplo, só foi usar uma faixa depois de anos de prática, e antes de usá-la, já era á muito tempo um perito. Primeiro não existia o karate-gi, foi inventado depois. As primeiras graduações foram a faixa-branca (Mudansha) e faixa-preta (Yûdansha)*. O Curioso é que amarravam formas bem diferentes da que amarramos hoje.


Os primórdios do karate. Esta vendo alguma faixa? Só na cabeça. Não tinha nem o Do-gi.



Motobu, Miyagi e Funakoshi amarrando o uwagi para não abrir. Jeitos muito diferentes de amarrar a faixa, nem parecido com as formas de hoje.


Saindo do contexto histórico e voltando ao mito, vejo o quanto se dá um valor exagerado e ao mesmo tempo equivocado para o uso da faixa-preta. Muitos quando a recebem ficam a se exibir por ai como se fossem crianças que ganharam um brinquedinho que poucos têm. Isto quando não serve somente para enaltecer o ego inflado de pessoas que sequer tem maturidade de vestir uma faixa-preta.

Digo uma coisa que deve servir para todos aqueles que estão para fazer exame para faixa-preta:

SE VOCÊ NÃO SE GARANTE SEM UMA FAIXA-PRETA, JAMAIS VAI SE GARANTIR COM ELA.

Vou dizer mais, a pretinha não é nenhum objeto mágico, miraculoso, iluminado, que vai mudar a sua vida no karate. Plim! Ganhei a preta! Agora sou o bonzão, ninguém mais me segura no karate. Isto é patético, conheço karateka de depois de se tornar preta até regrediu, ficou pior, sem falar nos muitos que pararam, não foram alem. Não são poucos os que param no 1ºDan.

Tem mais, existem senseis por ai que ficam a fazer exames em seus alunos passando eles de faixa em faixa sem que tenham competência. É só dar o dinheiro que se faz o exame. Por isso não se surpreendam se vocês virem por ai Mané que é uma verdadeira pereba no karate exaltando uma faixa-preta. Aliás, um dos meus senseis falou uma vez: Se você chutar uma lixeira por ai na rua, pulam dez faixas-pretas.

Eu já vi pessoas ainda na faixa-roxa que tinham muito mais competência para ser faixa-preta, muito mais maturidade, muito mais qualidade técnica, mas estavam da roxa simplesmente porque não viam necessidade de fazer exame. Tem muitos colegas meus que ainda estão no 1ºDan, mas que mereciam 3ºDan. Porem tem faixa-preta por ai que não dou nem uma faixa-laranja, aliás, desejaria que nem tivessem encontrado o caminho do karate, pois só dão vergonha.

A faixa-preta é um peso muito grande e por isto mesmo que exige muita maturidade para tê-la. Todas as faixas, independente da cor, são um peso a mais. Exigem maturidade a branca, a amarela, a vermelha, a laranja... Para praticar o karate tem que haver maturidade! A graduação que se ganha não é para ficar se vangloriando para os outros, não é objeto de exibicionismo, é para HONRAR! A faixa é um merecimento, é parte de você, do seu esforço, do seu suor, da suas dores, das inúmeras pancadas. Faixa sem suor não vale nada!

E pra finalizar eu vou dizer que o Karate não termina na faixa-preta, o karate não termina nem quando tu entras no caixão, se duvidar vai alem da vida. Como diz nos “Vinte princípios do Karate”:

“O karate é uma pratica vitalícia.”

Em outras palavras:

“O karate é para a vida toda.”

Aliás, o karate inicia na preta!

As outras cores foram só pra te preparar para o karate.


*Errata - fui corrigida pelo sensei Denis Andretta com relação ao contexto histórico na questão da aplicação das faixas coloridas no karate. Segundo seu esclarecimento o karate adotou do sistema de kyu/dans porque na epoca era uma exigencia da DAI NIPPON BUTOKU-KAI para reconhecimento do Karate no Japão. O primeiro sistema de graduação, anterior a atual, eram penas duas Faixa branca (Mudansha) e Faixa preta (Yûdansha). Jigoro kano era um homem de visão e um colaborou muito com grandes senseis como Funakoshi, Mabuni e Miyagi para a divulgação do karate de Okinawa.
O pior de tudo que eu sabia disto.
Peço desculpas a todos, Gomen.
Recomendo que ler o comentário que ele fez.

8 comentários:

  1. Ah! A faixa preta... quanta coisa dita!

    Algumas com fundamento... outras nem tanto.

    Um problema comum, já identificado pelo texto, é a visão pouco clara e sem nenhum fundamento da faixa preta como sendo uma meta...

    Se esta forma de pensamento fosse divulgada apenas entre leigos, em meu ponto de vista, até não seria tão ruim... afinal de contas são leigos! O pior é quando isso acontece vindo de pessoas que já acumulam muitos anos com a tal faixa preta na cintura.

    Nos primórdios de fato as graduações não existiam em Karate.

    O Karate é de Okinawa e lá as graduações não existiam.

    Funakoshi não “achou interessante” a graduação do Jûdô... ele (e todos os demais mestres de Okinawa que buscavam reconhecimento do Governo Japonês) foi obrigado - sim, O-B-R-IG-A-D-O – a adotar o sistema Kyû/Dan de Kanô, pois esta era uma, entre outras, das exigências da DAI NIPPON BUTOKU-KAI para reconhecimento do Karate no Japão.

    Kanô era um homem de visão que respeitava todas as artes marciais e que ajudou não somente Funakoshi, mas também Mabuni e Miyagi em suas tarefas de divulgar o Karate de Okinawa no Japão.

    Graduações originais: Faixa branca (Mudansha) e Faixa preta (Yûdansha)... tudo que veio depois são acréscimo e distorções do sistema original. Tais graduações eram usadas para separar aqueles que ainda não tinham nível (Mudansha) daqueles que já tinham nível (Yûdansha) para iniciar de uma forma efetiva no início da prática da arte marcial que havia escolhido para treinar.

    Hoje, isto estaria dividido da seguinte forma:

    Da faixa branca até a marrom = Mudansha;
    A partir da faixa preta = Yûdansha (e é por isso que costuma-se dizer que começamos nosso treinamento na faixa preta).

    Naturalmente, não esta a aplicação que vemos por aqui (no ocidente).

    Particularmente, divido os praticantes faixas pretas em dois tipos: Aqueles que tem faixa preta e aqueles que são faixas pretas... estes últimos não precisam ostentar nada.

    Ver regressão em praticantes que chegam na faixa preta é algo bem normal... ver praticantes que param quando chegam a preta, infelizmente, também... e isso se deve ao fato que foi abordado no primeiro parágrafo do texto... VER A FAIXA PRETA COMO UMA META. “Ufa! Atingi minha meta... e sendo assim, agora é hora de relaxar” ou “Beleza! Agora sou faixa preta... estou pronto”... tolice! É agora que deveriam estar começando o treino efetivo.

    Com relação a graduação, acredito que é um processo natural e que deve ocorrer sempre baseado em uma evolução individual, ou seja, se o praticante sabe (teoria + prática) hoje mais do que ontem não por que não graduar... O problema, em meu ponto de vista, é acreditar que todo faixa preta é, automaticamente, instrutor!

    Competência, maturidade, qualidade técnica... são elementos pessoais/individuais e como tal alguns atingem antes... outros depois... alguns nunca atingem... isso tudo faz parte. Não há garantia que indivíduos que treinem com o mesmo professor, durante o mesmo período, sob as mesmas circunstâncias... tenham o mesmo desenvolvimento (Vygotski é uma leitura interessante neste sentido), resumindo cada um atinge (ou não) as coisas a seu tempo.

    Ter a faixa preta é algo bem comum... Ser um faixa preta é, de fato, uma grande responsabilidade.

    Devemos treinar por treinar... não pela faixa!

    Devemos graduar por que esse é um processo natural... não pela cor da faixa!

    Enfim, o subtítulo do seu BLOG, acertadamente, porém parcialmente, já resume o que é o Karate: “O Karate é literalmente treinar, treinar e treinar, aprender, aprender e aprender. E quando estiver bem cansado começar tudo de novo”.

    Quanto ao parcialmente, acredito ter faltado “estudar, estudar, estudar”...”
    Parabéns pelas idéias e pelo trabalho... continue firme nele!

    Um abraço,
    Denis Andretta.

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  2. Obrigado por seus esclarecimentos Denis. Vou pensar sériamente nas suas colocações. E obrigado por me corrigir com relação ao contexto histórico.

    Instrurores faixas-pretas, isto tem demais. Ensinar karate não é facil. Tem uns ai com "curriculo" enorme que não eu não ponho minha mão no fogo não.

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  3. Estava relendo meu comentário e notei que em dois momentos "pensei" mas "não escrevi" duas palavrinhas, em dois parágrafos... sem elas talvez minhas idéias não fiquem claras:

    Primeira: No parágrafo onde diz: "Naturalmente, não esta a aplicação que vemos por aqui (no ocidente)." Faltou o "É", ou seja, o correto é:

    "Naturalmente, não "é" esta a aplicação que vemos por aqui (no ocidente)."

    E a segunda, na parte onde consta: "se o praticante sabe (teoria + prática) hoje mais do que ontem não por que não graduar..." Faltou o "TEM"... aí vai o correto:

    "se o praticante sabe (teoria + prática) hoje mais do que ontem não "tem" por que não graduar..."

    Desculpem-me as falhas!

    Um abraço,
    Denis.

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  4. Agora me lembrei que outro dia meu namorado falou das graduações Mudansha e Yudansha. Ele me passou bem direitinho o que tu colocou aqui. Ele comentou comigo que o sistema de faixas coloridas é era mais motivador do que ficar anos com a faixa-branca. Mas estava tão atucanada fazendo uma outra coisa que nem prestei muita atenção.

    Com relação aos não leigos, acho que aprender ou não a respeitar a graduação da maneira devida vai muito do carater da pessoa. Infelizmente lamento que algumas pessoas encontrem o caminhos do karate, ou de qualquer outra arte-marcial que seja.

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  5. Já que o assunto é faixas e sistema de graduação...

    Vamos lá, então:

    BREVE EXPLICAÇÃO SOBRE A CRONOLOGIA DAS FAIXAS.

    1883 - Kanō Sensei adota o sistema de níveis (Kyū/dan) do "Go" (e das equipes de natação) e divide os alunos em Mudansha (FAIXAS BRANCAS) / Yūdansha (FAIXAS PRETAS).

    1886 - Os Yūdansha começam a usar "cintas" pretas com KIMONO (Sim, neste período ainda usavam Kimono mesmo...).

    1895 – O Governo Japonês estabelece a DAI NIPPON BUTOKUKAI

    1907 – Acontece a introdução do Jūdōgi branco (usado atualmente e que mais tarde daria origem ao Karategi) - mas faixas eram brancas e pretas apenas. Neste ano, a faixa preta padrão (aquela que nós usamos hoje) substituiu a "cinta" preta do Kimono (que era mais larga).

    1924 - Em 10 Abril, Funakoshi Sensei certifica SHODAN: Tokuda, Ōtsuka, Akiba, Shimizu, Hirose, Gima e Kasuya (é a 1ª vez que o sistema Kyū/Dan aparece em Karatedō)

    1930 - Acontece a introdução da faixa vermelho e branca (Kōhaku) para o 6º, 7º e 8º Dan.

    1935 - No ocidente, surge o sistema de faixas Kawaishi Minosuke (diz-se ter sido criado para incentivar os ocidentais - que não agüentavam ficar sem graduar ou ficar com uma faixa da mesma cor por muito tempo - a persistirem nos treinos - oferecendo, então, um maior leque de "incentivos" (mais cores) a ser atingidos... (!?) Assim sendo, neste sistema "para ocidentais verem", as cores passaram a ser as seguintes: branca, amarela, laranja, verde, azul e marrom. Hoje tantas outras variações de cores... são utilizadas com o mesmo fim).

    1943 - Acontece a introdução da faixa vermelha para o 9º e 10º Dan.

    1958 - A faixa marrom é adicionada ao sistema Kyū/Dan para indicar alunos mais avançados "não-faixas-pretas".

    1960 - A faixa verde é adicionada ao sistema Kyū/Dan para utilização em escolas secundárias.


    Notas:

    A utilização do Sistema Kyū/dan e uniforme padrão baseado no Jūdōgi eram 2 das 4 condições que a Dai Nippon Butokukai exigia para reconhecer o Karatedō como "arte marcial verdadeira") .

    Pode-se afirmar que - basicamente - o sistema Kyū/Dan japonês teria apenas duas faixas: branca e preta. Contudo, com a finalidade de indicar os kyū mais avançados utilizou-se a faixa marrom. A faixa vermelho-e-branca é cerimonial e, em certa medida, opcional, podendo ser substituída pela faixa preta em qualquer momento.

    O sistema Kyū/Dan de graduação no ocidente (conhecido por sistema Kawaishi) apresenta basicamente as sete cores que conhecemos: branca, amarela, laranja, verde, azul, marrom e preta. (Ok, ok... cientificamente preto e branco não são cores... Branco é a união de todas as cores e preto é a ausência total de cor).

    Não há, portanto, nenhum significado místico, esotérico, transcendente ou que mereça atenção desmedida a respeito das cores das faixas, mesmo que muitos autores "teorizam" sobre os aspectos sobrenaturais das mesmas.

    Ou seja, as faixas apenas deveriam servir, numa análise muito rápida, para indicar o grau de conhecimento do praticante de determinada arte.

    Como as faixas do Karatedō e demais Budō seguem obrigatoriamente (condição definida pela Dai Nippon Butokukai) o sistema das faixas do Jūdō, a história das faixas do Jūdō passa a ser "história geral das faixas das Artes Marciais Japonesas".

    Saudações,
    Denis Andretta.

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  6. Notem que este tipo de comentário construtivo eu não apaguei, alias faço questão de deixar pois bons exemplos temos que valorizar. Porem os comentários que vieram após destes acima (de autoria da mesma pessoa) em outros post foram deploráveis, fiz questão de apagar.
    Isto é pra não dizer que não valorizo e não respeito outros colegas de karate quando me corrigem, eu sei quando estou equivocada e acredito que tenha maturidade o suficiente para reconhecer isto.
    É este tipo de comentário que quero, os outros inspirados pelo orgulho e ego alterados eu não quero.

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