quarta-feira, 23 de março de 2011

As fotos presentes no Dojo

Se quiser saber mais dobre o assunto vide tambem o post: Karate e religião japonesa


Qualquer praticante de karate (e de outras artes marciais) pode observar a foto do mestre fundador do estilo pendurada na parede.


Fotos dos mestres do karate que geralmente estão em lugar de destaque no Dojo

Porque aquela foto?

Muitas pessoas por ai vão me dar uma resposta na ponta da língua, etc. Outros só sabem que ela esta lá para lembrar o fundador do estilo. Esquece o que você vai ler por ai no “wiki da vida” e em outros blogs que só usam o recurso do “Ctrl+C” e “Ctrl+V”. Existem muitos blogs por ai que o conteúdo não é muito confiável, são poucos os autores que se prontificam a realmente estudar e dar a seus leitores um estudo sério. Conheço colegas meus que são ótimos exemplos de karatekas e fazem blogs de ótimo conteúdo, porem tem uns por ai que só querem aparecer.

 Meu depoimento se baseia em vivências de família.

As fotos no Dojo não servem só de enfeite, existe por trás destas imagens um significado muito mais profundo. No Japão se cultua muito os antepassados, principalmente aqueles que nos deixaram algum legado como um pai, uma mãe, um mestre, um professor, um tutor. Qualquer casa em que algum chefe de família já tenha falecido sempre vai se encontrar uma foto dele exposto em algum lugar, muitas vezes próximas de um oratório (Butsudan para os budistas ou Kamidana para os shintoistas). Via de regra, no budismo não há culto aos antepassados, o que se reverencia num butsudan é a o Buda Histórico (Shakyaumi Buda), porem no Japão geralmente os funerais são feitos com rituais budistas. É no shintoismo que se cultua os antepassados. Mas devido ao sincretismo as vezes numa mesma casa pode haver no mesmo espaço um kamidama e um butsudan.
Aqui no Brasil foi introduzido somente o uso da foto no Dojo, pois seria muito custoso fazer um oratório. Alem do mais, para se ter um altar alguém na academia também deveria saber cuidar dele e isso envolve algum conhecimento religioso (o que não cabe a mim ensinar), e como estamos num pais essencialmente cristão, fica um pouco complicado. O próprio governo japonês (consulados e embaixadas) recomendava aos religiosos japoneses (budistas e shintoistas), que vinham aqui para o Brasil atender a demanda dos nipo-brasileiros, que tivessem discrição na pregação de suas religiões. Pois um o fato de vir para um pais de maioria cristã pregar outra religião poderia gerar conflitos.




Em algumas imagens feitas da JKA dá para ver um oratório (Kamidana*) ao fundo do Dojo.


Minha irmã quando viajou para o Japão pode visitar meus tios. Meu pai fez muitas recomendações caso ela fosse visitar a casa dos meus falecidos avós (onde hoje mora minha tia), disse a ela o que levar e o que fazer, etc. Como ela não estava muito acostumada foi entrando na casa de minha tia e não viu o altar que estava na entrada. Minha tia Taka a chamou de volta e falou:
“- Fulana, tu não vai cumprimentar teus avôs antes de entrar na casa deles?”

Claro que minha irmã não era obrigada a saber pois não estava acostumada a fazer, porem isto foi um pouco constrangedor pra ela.

Ela teve que voltar e cumprimentar o altar, acender dois incensos e orar. Também teve que entregar dois mochis (bolo de arroz) de oferenda. Mesmo estando mortos a casa ainda pertence a meus avôs e se deve pedir licença ao entrar na casa de seus donos.

Quando se entra num Dojo se leva em consideração exatamente isto, a presença do mestre fundador do estilo dentro do local da prática dos exercícios. Deve-se considerar em primeiro lugar que a presença dele se encontra ali, dentro do Dojo.

Então karatecas, nunca esqueçam, antes de iniciar sua aula de karate, cumprimente o Dojo (conseqüentemente a presença do sensei fundador do estilo, Funakoshi, Mabumi ou Miaygi, etc), cumprimente seu sensei, cumprimente seus colegas.

Não limite o seu momento de mostrar respeito aos grandes mestres somente no cumprimento inicial ou final da aula, mostre este respeito sempre. Quando estou praticando sozinha no Dojo sempre procuro cumprimentar o mestre antes de depois da pratica dos exercícios. Devemos o estilo que praticamos ao esforço deles, ao conhecimento que eles nos passaram.

Não esqueça um dos princípios do Dojo Kun: "Respeito acima de Tudo".

Este respeito inclui tambem nossos antepassados, principalmente os do Karate.

Oss.

Atenção: Não vai ficar por ai oferecendo bolinho de arroz pra foto, acendendo incensos , só por que dei o exemplo da minha família. Como eu falei, tem que saber como fazer isto. Tem que procurar a orientação de um monge budista ou um sacerdote shinto.

Obs.: Eu sei que algumas pessoas são devotas e praticam sua religião, por isto mesmo não são obrigadas a praticarem aquilo que não aprovam. Se este é seu caso leitor, saiba que aqui eu só dei exemplos, só expliquei a origem do ato de cumprimentar as fotos. Se algum professor de karate impor fazer algo que contrarie suas crenças, não é obrigado a fazer. 

KARATE NÃO É RELIGIÃO!


P.S.: Algumas explicações sobre a religiosidade do japonesa esta em outro post (Karate e religião japonesa), nele explico a diversidade religiosa no Japão e as influencias que cada uma tem no povo japonês.
P.S. 2: Uma errata: as fotos não ficam dentro do altar, nem do butsudan e nem no kamidama, elas ficam próximas do altar e não dentro. A confusão de minha parte é porque minha mãe (que não é japonesa) colocou as fotos dentro do butsudan e meu pai não questionou. No Budismo se reverencia a imagem de Shakyaumi Buda e ele deve ser a figura central num butsudan. Via de regra não há culto aos antepassados no budismo, porem no Japão, algumas vezes dentro das casas o butsudan divide o espaço com o kamidama. No kamidama deve ter dentro dele um espelho que remete a Deusa Amaterasu. As fotos dos antepassados geralmente estão perto do altar, nunca em posição de destaque. Tinha um casal de senhores que apadrinhou meu pai aqui no Brasil, eu os chamava de Diichan e Baachan (vovô e vovó), eles tinham um altar shintoista, mas a foto dos antepassados estava ao lado do altar e não dentro. 

2 comentários:

  1. Excelente...

    Analogia simples e esclarecedora!

    Parabéns!

    Saudações,
    Denis.

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  2. Osu!
    teria alguma matéria sobre o direito e as historias dos símbolos usados para descrever os estilos?

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